DISCURSO DE ABERTURA DA CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2020
INAUGURAÇÃO DA CASA ESPERANÇA GARCIA (SETOR SOCIAL DIOCESANO)
Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!
Nesta noite memorável de encontro de irmãos e de irmãs nos reunimos, aqui nesta casa, o Sobrado Major Selemérico. Um espaço que, por sua natureza, nos faz adentrar na história e na cultura de nossa cidade, de nossa Região e do nosso Piauí. Desde já, agradecemos a Maurenize, diretora desta casa, por nos disponibilizar este espaço para oficializarmos em âmbito diocesano a Campanha da Fraternidade/2020.
A Campanha deste ano nos interpela para não nos esquecermos que a prática da fraternidade e a luta pela defesa da vida são manifestações do dom de Deus que há em nós e chamado ao compromisso contínuo com a prática da caridade. “Em tudo, a caridade”. O texto de Lucas 10,33-34, toca nos mais profundo do nosso ser e nos convida a confrontarmos nossas práticas com os ensinamentos de Jesus Cristo. Ele nos aponta para um samaritano, que seguindo o caminho para cumprir as suas obrigações, de repente se depara com certo homem assaltado, desnudado e espancado, jogado à beira do caminho, quase morto, vítima de violência, uma situação deprimente vivida no passado e que, nos dias de hoje, se agrava cada vez mais em nossa sociedade. Qual foi a atitude daquele samaritano? “Viu, sentiu compaixão e cuidou dele”.
Jesus nos interpela para não fazermos como o Levita ou como o Sacerdote que, por causa da correria da vida, não foram capazes de perceber o grito e o pedido de clemência daquele pobre coitado jogado à margem da estrada. Quantos no mundo de hoje estão jogados, esquecidos, espancados, marginalizados, condenados a viverem no submundo da vida, mergulhados nas drogas, na prostituição, experimentando o abandono, a fome, a falta de esperança. Outros, por causa de suas feridas psicológicas e angústias interiores, por razões aparentemente inexplicáveis, sentem-se impotentes e, às vezes, até mesmo sem condições de gritar para pedir socorro. É neste mundo, nestas realidades, que Jesus nos convida a entrar, enxergar, sentir compaixão e cuidar.
O Setor Social da Diocese de Oeiras, através dos diversos grupos e instituições, que o compõem (CEFAS, Cáritas, Fazenda da Esperança, Pastoral da Criança, Grupo Esperança Viva, Pastoral da Pessoa Idosa, Irmãs de Santo Antônio, Fundação dom Edilberto, Fraternidade São Francisco…), procura ser uma resposta a estes desafios, assumindo o pilar da caridade no serviço à vida plena para todos. Estas ações acontecem, graças ao empenho de muitos voluntários e, em alguns projetos específicos, graças à ajuda de benfeitores, irmãos nossos de outros países que, conhecedores dos problemas de nossa Região, tornam-se solidários na partilha.
UM GESTO CONCRETO IDEALIZADO QUE SE FAZ REALIDADE
Também nós somos chamados a esta prática da solidariedade com o gesto concreto da Coleta da Campanha da Fraternidade a realizar-se no domingo de Ramos em todas as paróquias. Graças à Coleta da Campanha da Fraternidade/2019 foi possível idealizarmos um sonho que, com a ajuda de outros parceiros o transformamos em realidade. Eu estou falando da nova casa que vamos abençoar e inaugurar, localizada a poucos passos deste Museu. Trata-se de um imóvel que tem muita história para contar: já abrigou religiosas, serviu de cárcere para detentos, por ter sido cadeia pública e inspirou músicos, por ter funcionado como Escola de Música. Agora torna-se o “guarda-chuva” de nossa ação caritativa. Passa a ser o Setor Social Diocesano – Casa Esperança Garcia.
O NOME ESCOLHIDO: “CASA ESPERANÇA GARCIA”
Poderíamos ter escolhido o nome de algum santo de nossa Igreja, pois temos grandes referências que servem como testemunho de amor a Deus e ao próximo, verdadeiros exemplos de resignação e santidade, verdadeiros heróis na história da humanidade. Mas achamos por bem, neste caso, por se tratar de uma casa que vai representar a ação social de uma instituição, trazer à memória, evidenciar alguém que na sua simplicidade e humildade, expressou grandeza, coragem, ousadia, confiança e fé. Estamos falando de Esperança Garcia, uma mulher, pobre, negra e escrava que não se curvou diante de sua situação e implorou do governo o que ela entendia como direitos essenciais.
No site Heróis do mundo, no endereço: http://antigo.acordacultura.org.br consta o seguinte conteúdo a respeito de Esperança Garcia: “Trata-se de uma mulher escravizada que, no final do século XVIII, escreveu uma petição destinada ao governador do Piauí… Em 6 de setembro de 1770, a escravizada dirigiu uma petição ao Presidente da Província de São José do Piauí, Gonçalo Lourenço Botelho de Castro, denunciando os maus-tratos físicos de que era vítima, ela e seu filho, por parte do feitor da Fazenda Algodões… A atitude de Esperança Garcia não era uma prática. A habilidade dela em perceber a viabilidade de conciliar seu letramento com recurso de reivindicação evidencia sua capacidade de análise de conjuntura e habilidade política ao expor, na petição, a necessidade de realizar alguns sacramentos relacionados à religião católica, assim como a crença na possibilidade de ver sua solicitação considerada pelas autoridades… É importante lembrar que, tendo em vista a importância dada à petição de Esperança Garcia, por força da Lei nº 5.046, de 7 de janeiro de 1999, ficou instituído o dia 6 de setembro, data da petição, como sendo o “Dia Estadual da Consciência Negra” no Piauí”.
Podemos dizer que Esperança Garcia agiu como a viúva da parábola do Evangelho de Lucas 18, 1-8, que se contrapôs à iniquidade de um juiz que não temia a Deus e não se importava em praticar a justiça. Mas, pela persistência da mulher, o juiz cedeu e atendeu ao seu pedido, fazendo-lhe justiça.
Ressaltamos que a escolha do nome ESPERANÇA GARCIA representa o sentimento de esperança de pessoas que acreditam na transformação da sociedade e da realidade sócio-política, e que isto se torna realidade a partir da consciência crítica do ambiente em que se vive e da capacidade de análise para transformar esta realidade num mundo mais justo, onde os direitos inalienáveis das pessoas sejam respeitados e a dignidade de cada um seja garantida. A Casa Esperança Garcia será, portanto, um lugar de referência, sobretudo para as pessoas que, como esta mulher-negra-escrava-pobre, vivem em situação de vulnerabilidade e de desamparo, muitas vezes, por falta de políticas públicas e de compromisso social da parte do governo e da sociedade.
GRATIDÃO AOS PARCEIROS
Vários serviços foram realizados no imóvel: Dobramos a sua capacidade de espaço físico de 120 para 240 metros quadrados, seis salas climatizadas, banheiros novos, novo salão, cozinha, despensa, portas novas, pintura nova, instalação elétrica tudo refeito, caixa d’água nova, acessibilidade da entrada ao final da casa, jardinagem no terreno da frente e novos equipamentos. O investimento custou em torno de 150 mil reais. Como conseguimos? Um milagre de Deus. Tínhamos apenas vinte mil reais da CF/2029. Fomos juntando as moedas da seguinte forma: utilizamos 22 mil reais da Fazenda da Esperança (uma reserva que tínhamos para melhoria de imóveis), Conseguimos com a Cáritas Regional vinte mil reais, José Raimundo, prefeito de Oeiras, em seu nome próprio nos doou alguns equipamentos (60 cadeiras, 01 mesa e um bebedouro), O Ibama de Teresina nos doou a madeira, Luiz do Ciata nos presenteou com 35 metros de piso, O Padre Gabriel (da Espanha) havia feito uma doação de dois mil reais e o utilizamos para este fim. Contamos com a ajuda de um doador anônimo de um mil reais, Olavo Braz nos doou 15 mudas de ipê branco. Agradecemos ainda a gentileza da arquiteta Raissa Freitas e do engenheiro Japher (Japhezinho) que nos prestaram serviços gratuitamente. Do mais que faltou, a Diocese de Oeiras completou.
Agradecemos aos nossos heróis, os pedreiros, serventes, pintores, etetricistas e prestadores de serviços que deixaram suas marcas e ajudaram a escrever as páginas desta história. Agradecemos ainda ao Leonardo, funcionário da Cúria que ajudou ao bispo no acompanhamento da obra e nas providências necessárias para garantir a execução da obra.
FUNCIONAMENTO DA CASA
Já estão instalados na casa a Cáritas, Fazenda da Esperança e Pastoral da Criança. Algumas funções foram definidas para garantir o melhor funcionamento da casa: 1) O Administrador da Casa é Padre Julielmo, com a ajuda do Bispo; 2) O Responsável pela agenda da casa é Francisco (da Fazenda da Esperança); 3) O Responsável pelo jardim é o Rodrigo (da Cáritas). A casa não está totalmente equipada. Aceitamos qualquer contribuição das pessoas de boa vontade, seja financeira ou material.
Por fim, agradecemos a Deus por nos ter ajudado a seguir firmes neste projeto e nos ter proporcionado a graça de estarmos inaugurando o Setor Social Diocesano. Obrigado a todos os parceiros, benfeitores e amigos. Obrigado às autoridades que se fazem presentes, aos comunicadores, representantes de instituições, a todos, nossa gratidão. No final desta cerimônia, iremos até a Casa Esperança Garcia para procedermos com a bênção e participarmos de um coquetel. Deus nos abençoe e Nossa Senhora da Vitória interceda por nós.
Oeiras, 04 de março de 2020.
Dom Edilson Soares Nobre
Bispo Diocesano de Oeiras