Bombardeada, de todos os lados e, por todas as formas de excessos, nossa geração vive – sem se dar conta do fato – numa profunda crise de saturação de sentidos. As respostas ao “quem sou eu?”, “de onde vim?”, “pra onde vou?” e “o que devo fazer?” foram cooptadas, ao longo dos séculos, pela ideologia capitalista de liberdade e necessidade, arrastando-nos para um grande fosso de contradições e ambiguidades. A liberdade ganhou tons e práticas liberais, endossando o livre trânsito dos interesses individualistas. A necessidade foi sendo suplantada pelo supérfluo e deu expressão ao consumismo. Sem nenhum disfarce ou cerimônia a farsa capitalista implantou um modus vivendi baseado na extradição do homem e da mulher para fora de si mesmos; reféns da exterioridade.
Pronto! Assim somos nós: extraditados de nós mesmos numa completa desconexão com os nossos eixos vitais. Como vivemos? Numa insatisfação doentia que projeta o nosso vazio interior, para várias formas de compensações despersonalizantes, com seu corolário de frustrações, desencantos, abismos e, principalmente, com a perda do sentido da vida.
O ideal de felicidade e realização, fonte de nossas buscas fundamentais, perversamente, foi invadido por inversões: o sentido de ser pelo desejo-prazer de ter e possuir; situação que asfixia a existência humana, privando-a da oxigenação vocacional primordial, isto é, do chamado do Deus Criador. Não é, sem razão, a estatística, sempre, crescente de suicídio, depressão, drogadição, violência, banalizações…
O capitalismo, com sua ideologia, se estabeleceu como cultura: criou seu status quo de verdade e, não raro, de absoluto. Mas, não é por isso que permanecerá intocável. Nós podemos dar voz à consciência libertaria cristã, como quando fomos criados por Deus. Mas, extraditados, como estamos, para fora de nós mesmos, nossa voz é grito surdo. O ponto fraco da cultura capitalista é a pessoa ‘dona’ do seu interior, consciente de si e conectada com seus eixos vitais. O capitalismo não suporta pessoas bem resolvidas.
O caminho de volta do exilio exterior, ao qual estamos submetidos, chama-se vocacionalizar. E, o que é vocacionalizar?
Vocacionalizar é uma palavra nova; um neologismo que, quer indicar o caminho da auto consciência sobre o próprio ser, a existência e o sentido da vida; é o canal de conexão com o Criador, com seu chamado e o sopro vital; é o ponto de partida para as respostas ao “quem sou eu?”, “de onde vim?”, “pra onde vou?” e “o que devo fazer?”; é o estabelecimento de uma cultura vocacional.
Quando Deus criou o mundo (a luz, as águas, a terras e todos os seus seres), Ele agiu chamando, do nada, tudo para a existência. Ele dizia: “faça-se”. E tudo passava a existir, obedecendo ao seu chamado. E, Deus via tudo e, tudo era bom.
Na criação do ser humano, segundo as escrituras, o chamado de Deus para a vida, foi realizado com duas implicações: sentir o toque de Deus; com as mãos, Deus modelou o ser humano com toda a riqueza de detalhes e de ouvir a voz de Deus; insuflou sua voz para dentro dos ser humano; para o seu interior, na forma de sopro vital. Assim, quando Deus lhe toca seu corpo vibra e sente; quando Deus lhe fala, o eco de sua voz, chega dialogante em seu coração, como no dia primordial.
Uma vez que a vida tem vocação de eternidade, Jesus, encarnado esclarece o propósito dialogal do Pai na perspectiva da redenção: “Eu vim para que todos tenham vida e, a tenham em abundância” (Jo 10,10). N Apocalipse 3,20, personificando “o Amém, a Testemunha fiel e verdadeira, o Princípio da criação de Deus”, quer que seja transformado em “pão”, em relação de mesa e de aliança a resposta cotidiana ao seu chamado: “Já estou chegando e batendo à porta. Quem ouvir minha voz e abrir a porta, eu entro em sua casa e janto com ele, e ele comigo”.
Pelo batismo fomos chamados à uma nova vida, em Cristo. Nesse sentido, fomos constituídos sacerdotes da Nova Aliança para prestar culto à vida como servidores, defensores e cuidadores.
Se nosso primeiro chamado foi à vida, esta será, também, nossa primeira missão.
Por: Pe. Edivaldo Pereira dos Santos