Quem comunga na Eucaristia cria, para a própria vida uma dinâmica de aproximação e pertencimento a Jesus numa tal identificação com Ele, a ponto de sua existência ser um transbordamento permanente dos sentimentos, palavras e gestos de Jesus.
A Eucaristia transforma a vida! Que o diga o bispo vietnamita François Xavier Nguyen Van Thuan. Ele viveu nove anos preso e, fez na prisão, uma das experiências eucarísticas mais profundas que eu já tive conhecimento. Van Thuan faleceu em 2002.
A seguir, o testemunho dele…
“Quando fui preso em 1975, um angustioso questionamento se apoderou de mim: ‘Poderei ainda celebrar a Eucaristia?’ Foi a mesma pergunta que mais tarde os fiéis me fizeram. De fato, logo que me viram, perguntaram-me: ‘Mas, o senhor pôde celebrar a santa missa?’
No momento em que tudo veio a faltar, a Eucaristia passou a ocupar o primeiro lugar em meus pensamentos: o Pão da Vida. ‘Quem comer deste pão viverá eternamente. O pão que eu darei é a minha carne para a vida do mundo’ (Jo 6,51).
Em todas as épocas, especialmente em tempos de perseguição, a Eucaristia foi sempre o segredo da vida dos cristãos: o alimento das testemunhas, o pão da esperança.
Na Última Ceia, Jesus vive o auge de sua aventura aqui na terra: a máxima doação, no amor para com o Pai e para conosco, expressa em seu sacrifício, que ele antecipa dando-nos o seu Corpo e derramando o seu Sangue.
É deste momento culminante – e não de um outro, embora esplêndido e incomensurável, como a Transfiguração ou um de seus milagres – que Jesus nos deixa o memorial. Isto é, deixa para a Igreja o memorial-presença daquele momento supremo do amor e da dor na cruz, que o Pai torna perene e glorioso com a ressurreição. Para viver dele, para viver e morrer como ele.
Jesus deseja que a Igreja celebre a sua memória e viva os seus sentimentos e as conseqüências disso por meio de sua presença viva: ‘Fazei isto em memória de mim’ (lCor 11,24).
Permitam-me falar novamente de minha vida. Quando fui preso, tive de ir de imediato e de mãos vazias. No dia seguinte deixaram-me escrever para casa, pedindo as coisas mais urgentes: roupa, pasta de dente… Escrevi também: ‘Por favor, mandem-me um pouco de vinho, como remédio para minhas dores de estômago’. Os fiéis logo entenderam para que seria.
Mandaram-me um frasco de vinho para missa, com a seguinte etiqueta: ‘Remédio para dores de estômago’, e algumas hóstias escondidas numa tocha para proteger contra a umidade. A polícia me perguntou: -‘O senhor sente dores de estômago’? –‘Sinto’! –‘Aqui está um pouco de remédio para o senhor’.
A minha alegria naquele instante foi inexprimível: todos os dias, com três gotas de vinho e uma gota d’água na palma da mão, celebrava a missa: eis o meu altar e a minha catedral! Era autêntico remédio para o corpo e para a alma: ‘Remédio da imortalidade, antídoto para não morrer, mas para ter sempre a vida em Jesus’, como diz Inácio de Antioquia (PA, pp. 230-231).
Todas as vezes tinha a oportunidade de estender as mãos e pregar-me na cruz com Jesus, de beber com ele o cálice mais amargo. Todos os dias, ao recitar as palavras da consagração, confirmava com todo o coração e com toda a alma um novo pacto, um pacto eterno entre mim e Jesus, mediante o seu sangue misturado com o meu. Foram as mais belas missas da minha vida!”
(Fonte: Nguyen Van Thuan, François Xavier. TESTEMUNHAS DA ESPERANÇA: Quando o amor irrompe em situações de heroísmo e no dia a dia. Vargem Grande Paulista, SP: Editora Cidade Nova, 2002, pp. 133-141, capítulo 14).
Fonte: Pe. Edivaldo Pereira dos Santos
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